quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Carta de Luís Aleluia às Produções Fictícias

CARTA ÀS PRODUÇÕES FICTÍCIAS

Ao Exmo. Senhor,
Director Geral da Produções Fictícias
Dr. Nuno Artur Silva
Trav. da Fábrica dos pentes, 27 – r/c
1250'105 Lisboa


Lisboa, 3 de Setembro de 2009

Caro Nuno,

Confrontado com a informação que as Produções Fictícias, empresa que superintende, teria inadvertidamente omitido a série “As Lições do Tonecas” no vosso mais recente trabalho para a RTP que propunha uma retrospectiva dos 50 anos de humor televisivo produzido em Portugal,
numa Série de 4 Programas intitulada “DIVINAS COMÉDIAS”, e que sobre “As Lições do Tonecas” não havia quaisquer referências ou imagens, vejo, com grande satisfação e muito agrado que a suspeição não passa de uma acusação gratuita e sem fundamento, quem sabe até no pressuposto de denegrir e ofender a imagem da mais conceituada empresa portuguesa
de conteúdos para Televisão, Teatro, Rádio, Internet, Publicidade, Jornais, Livros, Discos e Cassettes Pirata.

É que depois de visionar o vosso Programa emitido pela RTP em 8/8/2009 que se encontra disponível na internet, no site http://www.rtp.pt/ da Estação Pública, verifico que a referência ao Programa “As Lições do Tonecas” está lá. Foi feita no primeiro Programa e devidamente enquadrada no capítulo dedicado às “Séries e às Sitcoms”.

Só de facto alguém pouco escrupuloso e com vontade de embirrar convosco é que não reparou na referência que, mesmo assim ainda dura 32 segundos e 4 décimos. Ora para quem só tinha quase 4 horas para fazer a Série, não está nada mal (Só quem estiver mesmo muito distraído é que não a vê). Está espectacular, inclui até imagens do episódio de estreia e o texto que as sublinha é bastante ilustrativo do grande respeito e deferência com que as Produções Fictícias e nomeadamente os autores da Série “As Divinas Comédias” tratam os profissionais do sector, digo os colegas que escreveram e produziram a Série “As Lições do Tonecas”, bem como os dois actores que a protagonizaram.

Atente-se, aliás, na sublime redacção do texto:
Uma surpresa de 1996… Quem diria que um clássico da rádio dos anos 30, escrito por José de Oliveira Cosme e interpretado por Vasco Santana e transformado num dos maiores Best-Sellers do humor nacional iria transformar-se numa das mais populares sitcoms portuguesas dos anos 90(sic)

Se me permite o reparo, neste extenso texto há apenas dois erros a manchar a extraordinária composição, o que indicia que alguém não fez correctamente os trabalhos de casa:

Primeiro, os textos que transformaram o clássico “As Lições do Tonecas” numa das mais populares sitcoms portuguesas dos anos 90, não são de José de Oliveira Cosme mas sim de Manuel Correia, autor e produtor que o Nuno conheceu. Foi presidente da APIT e, nessa qualidade foi um grande defensor dos Produtores Independentes de Televisão e que tinha por si
uma grande consideração.

Atrevo-me até a dizer que, se fosse vivo, o Sr. Manuel Correia não hesitaria em agradecer'lhe pessoalmente a atenção com que as Produções Fictícias trataram o Programa “As Lições do Tonecas”, que foi produzido pela sua empresa, a Firmadois.

Segundo, o actor Vasco Santana nunca fez as “Lições do Tonecas”. Desculpe-me, mas para quem pretendia um trabalho sério e honesto, este erro é de palmatória.

Mas o Nuno não se preocupe com isto; Primeiro porque são erros de somenos importância que qualquer um entenderá como pequenos lapsos e não como falhas de cultura. São tão insignificantes que, por si só, não irão com certeza abalar a imagem de sumidade cultural que vos é atribuída. E depois porque a audiência do vosso Programa não deve ter sido lá muito significativa… Mês de Agosto, muita gente fora!..

Ainda voltando ao enunciado, a expressão “Quem diria” presente no texto, que as más'línguas dizem tratar'se de uma manifestação de mau gosto e pejorativa eu, pelo contrário, vejo aqui uma forma humilde e inocente de denunciar uma cândida ignorância e uma vontade expressa de ser
esclarecido. Vejamos se consigo!

Ora vamos lá então ver “Quem diria”?
 Diria o actor Curado Ribeiro que fez a primeira distribuição, atribuindo'me o papel.
 Diriam os responsáveis pelos conteúdos da NBP que em primeiro quiseram produzir.
 Diria o actor Nicolau Breyner grande conhecedor destas coisas de televisão.
 Diria o produtor e autor Manuel Correia que produziu e escreveu os 180 episódios.
 Diria o produtor e apresentador de televisão e sócio da CCA, Senhor Carlos Cruz.
 Diriam, ao longo do tempo, 4 diferentes Directores de Programas da RTP.
 Diria a Administração da RTC pelos grandes encaixes financeiros em publicidade.
 Diriam alguns jornalistas da RTP para quem “O Tonecas” era uma alavanca de audiências.
 Diriam milhares de famílias que puderam juntar avós e netos frente à televisão.
 Diriam milhares de emigrantes portugueses, espalhados pelos Mundo inteiro.
 Diriam centenas de anunciantes que aproveitaram o Programa para vender produtos.
 Diria Milhão e Meio de fiéis espectadores da RTP que ainda hoje têm saudades do Programa.
 Diriam alguns intelectuais que precisavam de matéria para falar mal dos gostos do Povo.
 Diriam as quase duas centenas de profissionais do audiovisual que fizeram a Série.
 Diriam cerca de 160 convidados (actores, jornalistas, políticos, músicos e poetas etc.).
 Diria o meu médico de família e as duas enfermeiras do posto mais o administrativo.
 E diria também a porteira do prédio, onde eu vivi em Massamá, que me adorava ver.

O Nuno desculpe'me a franqueza, mas a julgar pelo exposto e a ser correcta a minha interpretação da expressão “Quem Diria”, julgo que os únicos que ainda hoje se interrogam sobre o sucesso da Série “As Lições do Tonecas”, são as Produções Fictícias e os autores deste trabalho. Veja que até a porteira do prédio onde eu vivi em Massamá conseguiu descortinar um tremendo sucesso de televisão.

E no entanto, apesar de humildemente se denunciarem surpreendidos (ou diria agastados?!) com o êxito de “As Lições do Tonecas” que marcou claramente a década de 90, não deixaram os autores da Série “Divinas Comédias” de lhe dedicar a atenção merecida que, apesar da exiguidade do tempo que lhe foi dedicada, e as imprecisões acima apontadas, não deixa de ser um acto significativo que merece realce e que não posso deixar de agradecer. .

Assim, pela grande deferência e respeito com que nos trataram neste vosso trabalho queiram aceitar, e peço-lhe ofavor de o transmitir aos seus rapazes, os meus mais sinceros agradecimentos.

Aliás, é justo que refira que não esperava outra atitude da vossa parte, porquanto, qualquer retrospectiva séria que fale de humor para televisão produzido em Portugal, quer se goste ou não, tem obrigatoriamente que referir o programa “As Lições do Tonecas”:



  • Que ao longo dos quatro anos de emissão (e não dois como tem sido tão profusamente anunciado)de 1996 a 2000, ajudaram a conseguir a proeza da RTP ultrapassar a fasquia dos 25 milhões de espectadores por semana através da difusão da RTP / RTPi / RTP África / RTP Madeira e RTP Açores.


  • Que fizeram com que em muitos lares brasileiros se procurasse a RTPi para assistirem ao Programa, (um pouco com o que cá se passava com a Sitcom brasileira “Sai de baixo”, produzida pela Rede Globo e que entre nós era retransmitia por cabo).


  • Que por ser um programa de entretenimento com uma forte componente didáctica, divertiu, ensinou e ajudou a esclarecer milhões de espectadores de língua portuguesa espalhados pelos 5 Continentes e que se identificaram com as suas raízes culturais.


  • Que foi premiada tanto pelo seu impacte popular como pela interpretação dos actores e tanto cá, troféus NOVA GENTE e outras diversas distinções, como no estrangeiro, pergunte ao Herman José, nosso amigo comum, que chegámos a ir juntos, de propósito, a Nova Yorque receber os prémios pelo nosso destaque e empenho profissional.


  • Que abriu portas a um programa intitulado “O Recreio do Tonecas” que veio a revelar'se uma excelente aposta da RTP para a Área de entretenimento infanto'juvenil, que produziu dois discos “A Tabuada do Tonecas” e “As canções do Tonecas”, o primeiro com música de Jorge Quintela e o prestigiado coro de Santo Amaro de Oeiras e o segundo com letras de Teresa Correia e músicas de Toy e também um livro “As novas Lições do Tonecas”, que aqui lhe envio como prova do meu mais profundo agradecimento. Foi editado em 1999 para celebrar o tremendo sucesso de audiências que o Programa granjeou e que RTP obteve, através dele.

Desculpe, caro Nuno, percebo que o enfado com tanta descrição, ainda mais sobre matérias que o meu amigo, como Autor, excelente comunicador de televisão e Director de uma Produtora de conteúdos tão afamada, também experimenta com bastante frequência e conhece tão bem quanto eu; falo do sucesso dos seus Programas e o reconhecimento as audiências pelo seu desempenho profissional.

No entanto, veja o Nuno como há gente tão pérfida, há quem me aconselhe pouca efusividade nos agradecimentos a si a aos outros dois autores da Série “AsDivinas Comédias”, porquanto o destaque dado ao Programa “As Lições do Tonecas” ficou muito aquém da importância que tanto o Programa, como o autor e principalmente os actores, mereciam.

Mas não se preocupe que eu, a esses, já os pus na linha.

Expliquei'lhes que o que temos que respeitar aqui, são os critérios dos autores que idealizaram e criaram o formato do Programa e mais nada. Nem a RTP, que é quem paga o serviço, pelos vistos, tem a ver com isso.

Até porque, numa análise objectiva sobre o Programa ora apresentado, a Série “Divinas Comédias”, habilmente camuflada como uma honesta retrospectiva do humor televisivo português produzido nos últimos 50 anos, mais não é que um extenso Portefólio profissional da empresa Produções Fictícias, que desta forma destacam os seus artistas, publicitam os seus trabalhos, vendem os seus autores, nalguns casos explicam publicamente os seus desaires profissionais e noutros até aconselham a venda dos seus produtos. Embrulham o conteúdo em 50 anos porque só 15, e de poucos sucessos, dava muito nas vistas, intercalam'se com outros projectos de televisão de grande popularidade para obterem visibilidade e notoriedade e ilustram o trabalho com entrevistas de profissionais do audiovisual, para dar consistência e respeitabilidade ao projecto.

E se isto foi feito com dinheiros da RTP, estão no vosso direito. Não é a primeira vez que uma empresa Pública gasta o dinheiro que não tem, a subsidiar trabalhos de promoção de outras empresas, ainda mais tendo amigos bem colocados. Não nos podemos esquecer que a “Produções
Fictícias”, é uma Empresa Privada de Solidariedade Associativa. Aqui, peço'lhe desculpa, mas para que os detractores e grandes invejosos do vosso trabalho entendessem, tive que recorrer à vulgaridade de usar algumas imagens caricaturais que, embora de desprezível e abjecta banalidade, se revelaram de extrema eficácia para a compreensão do fenómeno. Disse'lhes que uma Empresa Privada de Solidariedade Associativa é por exemplo uma reserva de caça;

Delimita-se a coutada onde só podem entrar os sócios, os associados, alguns profissionais pagos para engodo e naturalmente alguns visitantes ilustres que, embora causando alguns estragos, não podem deixar de ser convidados pelo status e pela celeuma que levantaria, quer política, quer socialmente, se assim não fosse… E mais nada! Rigorosamente mais nada.

Claro que este método de trabalho, embora lícito (?!), perverte e vicia as regras de mercado, submete a liberdade criativa e, em última análise subverte a Democracia.

E isso que importa, quem vier atrás que feche a porta! Vamo'nos queixar a quem?

Este País, apesar de ser uma República, é Governado por quem gosta de reinar.

Mas mesmo assim, caro Nuno, não calcula a dificuldade que o Povo tem em entender estas coisas. Olhe que mesmo depois de eu perder um ror de tempo com estas explicações ainda há quem lance suspeitas sobre a honestidade intelectual do vosso trabalho e seriedade da Estação que o emitiu, a RTP.

Desconfio que o que lhes deve ter causado toda esta indignação, terá sido o facto de, como espectadores assíduos da RTP e grandes apreciadores da Série “As Lições do Tonecas” pelo tipo de humor que utilizava e que afinal de contas é o mais genuinamente português (ainda é dos anos 30, veja) e que por serem fãs do trabalho dos actores que o protagonizaram, ter-se- ão sentido desrespeitados pelo minguado destaque dado “Às Lições do Tonecas”, tanto pelo seu Programa “ Divinas Comédias” como pela Estação Pública que não teve quaisquer pejos em ofender os colaboradores que a alimentaram durante anos e uma grande parte da audiência que a sustenta.

Como me acho incapaz de explicar melhor os propósitos profissionais e os critérios editoriais que levaram as Produções Fictícias a tomar estas opções de tratamento desigual dado ao Programa “As Lições do Tonecas” em detrimento de outras séries, peço'lhe que seja o Nuno, em nome das
Produções Fictícias a explicar publicamente o que se passa, se achar oportuno, naturalmente…
E se souber, claro!

Da minha parte, creia o Nuno, que fiz tudo o que estava ao meu alcance para defender o vosso trabalho como aliás, sei que defendeu o meu, pois por vontade de alguns “As Lições do Tonecas”, levavam o mesmo sumiço de outros trabalhos que apesar de também terem tido bastante importância no humor televisivo nestes últimos 50 anos, nem sequer foram lembrados.

Daí o meu sincero reconhecimento. A si, grande Nuno e à equipa que escreveu, produziu e apresentou esta Retrospectiva de 50 anos de humor de televisão em Portugal,

os meus mais sinceros agradecimentos.
Com os melhores cumprimentos,
Luís Aleluia
(Actor que interpretou a personagem de “Menino Tonecas” na Série da RTP).




Cópias para:
Primeiro-ministro, Ministro dos Assuntos Parlamentares, Ministro da Cultura, Presidente do Conselho de Administração da RTP, Órgãos de Informação, Sociedade Portuguesa de Autores, Cooperativa de Gestão dos Direitos dos Artistas, Sindicato dos trabalhadores do Espectáculo, Entidade Reguladora para a Comunicação Social, RTP - Provedor do espectador, Produções Filipe Lá Féria, Associação Portuguesa de Famílias Numerosa e Associação Nacional de Caçadores de Galinholas.

5 comentários:

  1. E eu que pensava que o menino Tonecas nem sequer sabia escrever. Agora já percebi por é que andaste arredado da televisão estes últimos tempos... Andaste a acabar o curso, não foi?! Parabéns pela carta e espero que muita gente a leia, acho-a esclarecedora de muita coisa que se passa neste quintal à beira-mar...
    Vai-te a eles puto!

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  2. Luís, amanhã vou fazer uma sardinhada cá em casa com sardinha de Sines e com um bom tinto alentejano do Redondo. Para sobremesa tenho um queijinho de Serpa de se lhe tirar o chapéu e uma marmelada caseira feita com os marmelos do meu Monte do Cercal.
    Imagina que até tenho café de S. Jorge e digentivo de poejo... Que grande país este que tem tanta coisa boa. Depois também tem algumas coisas más... Mas esses "rapazes pequenos" não os vais encontrar cá em casa! Tu serás sempre bem vindo! Guilherme Leite

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  3. Pois é Luis,injustiças praticadas pela RTP,e seus apaniguados são muitas.
    Senão vejamos...José Viana,um dos grandes do nosso lindo País,fez vários trabalhos para a RTP,onde estão???Pelos vistos desapareceram,um dos últimos foi uma série de seis programas,de Revista à portuguesa,com o titulo,ORA VIVA!Onde estão,que nem a RTP Memória os transmite,sumiram...e porquê?São perguntas e mais perguntas,mas nenhuma com resposta.
    Em relação ao que fizeram,a ti e ao Morais e Castro,é de uma baixeza incrivel,mas como és superior a isso tudo,e todos nós reconhecemos o teu valor,não só como autor e actor,mas como ser humano,borrifa-te nisso,e aceita o convite do Guilherme Leite,e diverte-te com os amigos verdadeiros.
    Bem hajas por seres quem és.
    Beijitos para ti e familia
    Elisabete Lobo

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  4. Oi Luis,

    Que feliz fico ao constatar que o nosso doutoramento, nos fez tão bem. A ti mais que a mim, porque realmente Sr. Dr. há que reconhecer, que a lucidez de espírito e a coerência de pensamento estão em alta. Bença-te Deus, que não te quero dar olhado, já basta teres de lidar com tantos invejosos.
    Não sei se foste à patuscada em casa do Guilherme, mas não te esqueças que temos de festejar o fim do nosso curso.
    Temos de festejar, festejar hoje e sempre o facto de estarmos vivos, sem esquecermos de festejar também, que de forma diversa, fazemos cócegas a muita gente. Ainda bem que assim é!!

    Com muita amizade,

    Ana Enoch

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  5. Olá amigo Luis!
    Então os lindos meninos das Produções Fictícias não andaram á escola contigo? Olha que pelos vistos nem comigo!... É gente de que nunca me lembro de lhes ter posto a vista em cima... Até me parece que não estudaram cá; porque quem faz um programa a relembrar tudo o que de bom se fez no humor televisivo nos últimos 50 anos e não sabe que durante 8 desses anos, o Tonecas ensinou muita gente a tirar dúvidas e algumas incertezas, sobre o que tinha aprendido na escola e do qual muita coisa já não se lembrava!... Se calhar estes senhores também precisam d'umas Lições do Tonecas; mas sobre esta matéria para não correrem o risco das pessoas acharem esse tal programa! Uma grande parvoíce... E esta hem!... - Há!... Se calhar também não sabem quem popularizou esta frase. - Bom mas afinal o que tenho eu a ver com isso?
    1 Abraço! Eduardo Sant'Ana

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